Voluntários tiram dinheiro do próprio bolso para projeto ecológico

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Voluntários tiram dinheiro do próprio bolso para projeto ecológico


A dentista Simone Carrara, 40 anos, sempre se preocupou com o meio ambiente. Não joga lixo na rua, controla o consumo de energia e de água e ensina os filhos a agirem da mesma forma. Para Simone, no entanto, essas atitudes pareciam pequenas, pouco abrangentes. A dentista sentia que precisava fazer mais, só não sabia como agir. “Eu queria recuperar áreas desmatadas, mas achava que só grandes empresas, com muito dinheiro, eram capazes de fazer esse trabalho”, explica. Daí nasceu a ideia do projeto Poranga, responsável pela plantação de 2,5 mil mudas de 35 espécies nativas do cerrado em uma área de mata de galeria perto do Córrego Cabeça de Veado, no Jardim Botânico de Brasília (JBB).

No fim do ano passado, quando o projeto ainda não havia tomado forma, Simone comentou com o amigo e professor Rodrigo Studart Corrêa, 43 anos, sobre a intenção de agir diretamente nas regiões agredidas, em vez de apenas evitar que outras fossem destruídas. Especialista em recuperação de áreas em degradação da Faculdade de Engenharia Florestal da Universidade de Brasília (UnB), Corrêa afirmou que a ideia não era impossível. “Falei que não é tão caro quanto se imagina. Se ela reservasse uma quantia por mês e conseguisse o apoio de empresas, a vontade dela poderia se concretizar”, conta o professor.

Simone conversou com outro amigo, o dentista Jorge Faber, 41 anos, sobre a iniciativa de revitalizar áreas desmatadas. “O engraçado é que ela veio com essa história num momento em que eu estava muito interessado em neutralizar as emissões de poluentes da minha clínica de odontologia”, completa Faber.

Um outro integrante passou a fazer parte do projeto em fase inicial, o advogado Luíz Antônio Bettiol. A partir daí, Simone e Faber, donos de clínicas odontológicas, e Bettiol, de um escritório de advocacia, separaram aproximadamente R$ 5 mil dos ganhos das empresas para o Poranga. O professor Corrêa entrou com o conhecimento e todo o planejamento técnico de implantação do projeto. O dinheiro arrecadado serviria para pagar uma empresa especializada em reflorestamento. Só faltava achar o lugar a ser recuperado.

Em 23 de dezembro, os voluntários do projeto se reuniram com o diretor do JBB, Jeanitto Gentilini. Uma área equivalente a três campos de futebol, próxima ao Córrego Cabeça de Veado, foi oferecida ao grupo, além de 1.200 mudas de espécies nativas do cerrado. As outras 1.300 foram cedidas pela fazenda da UnB. O superintendente de Conservação e Manutenção de Coleções do JBB, Joaquim Gomes de Souza, também contribuiu com o conhecimento sobre a recuperação de locais degradados. A região foi desmatada há 20 anos quando havia uma chácara no local.

A mata de galeria, por se formar ao longo de córregos e rios, tem um papel importante na manutenção do equilíbrio do ecossistema. Mantém a quantidade e a qualidade da água. Evita que o terreno sofra erosão e impede que o barro e entulhos carregados com a água das chuvas sejam depositados nos leitos dos rios. Esse fenômeno, conhecido como assoreamento, provoca o desaparecimento de cursos d’água. Cerca de um terço da água que abastece o Lago Sul vem do Cabeça de Veado.

Dificuldade
Segundo Corrêa, existem alguns fatores que dificultam a recuperação de áreas como a do Jardim Botânico. Um deles é o fato de não ser creditado o devido valor ao cerrado. “Apesar de ocupar 25% do território brasileiro, a savana mais rica em biodiversidade do mundo já foi reduzida em 57%. É uma vegetação discriminada.” Atualmente, o cerrado não configura na Constituição de 1988 como patrimônio nacional, ao contrário da Mata Atlântica e da Floresta Amazônica, por exemplo. “Existe a crença popular de que a terra não é fértil e de que há poucas espécies”, completa o superintendente do JBB.

Outro empecilho é um inimigo natural: o capim-meloso. De acordo com o professor da UnB, essa vegetação tem a capacidade de crescer mais rapidamente do que as mudas plantadas pelo projeto. “O capim é muito competitivo. Rouba a luz e sufoca as plantas ainda em fase de desenvolvimento.” Para driblar a gramínea vinda da África nos colchões dos navios negreiros, o grupo estuda duas possibilidades: o uso de garrafas de refrigerante ou de uma biomanta, feita de fibra de coco e sisal, em volta do caule das mudas. Para reaproveitar materiais, os cabos de vassoura nos quais são amarradas as plantinhas foram retirados do lixo.

A inauguração oficial do projeto Poranga coincidirá com a festa de aniversário do JBB, no próximo dia 29 (veja quadro com programação). E o Poranga não pretende parar por aí. Está à procura de uma nova área a ser recuperada — e de mais voluntários. “Poranga, em tupi-guarani, significa belo. É nisso que queremos transformar locais desolados e agredidos”, explica Simone. Empresas e pessoas interessadas podem falar com a dentista no número 3245-1016.

Texto retirado de : http://www.correiobraziliense.com.br/html/sessao_13/2009/03/12/noticia_interna,id_sessao=13&id_noticia=88018/noticia_interna.shtml

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