Apenas 3% das comarcas do País possuem vara da infância e da juventude

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Apenas 3% das comarcas do País possuem vara da infância e da juventude

26/08/2008


• Nos 18 anos do Estatuto, levantamento da ABMP revela fragilidades do Sistema de Justiça especializada• CNJ estuda publicar resolução para criar parâmetros de criação de varas e equipes interdisciplinaresNo ano em que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) comemora sua simbólica chegada à “maioridade”, a ABMP divulga uma pesquisa que revela a falta de prioridade dada ao Sistema de Justiça da Infância e da Juventude. O levantamento revela que apenas 92 comarcas possuem varas da infância – o que corresponde a 3,4% das 2.643 comarcas de todo o País. Também foi constatada uma enorme disparidade entre as regiões: enquanto no Norte existe um juiz especializado para 279 mil habitantes, no Sudeste essa relação é de um juiz para 503 mil habitantes.O artigo 145 do ECA diz que o Judiciário tem a competência de estabelecer a proporcionalidade do número de varas exclusivas da infância e da juventude por número de habitantes. Dezoito anos após a promulgação do Estatuto, porém, nenhum Tribunal de Justiça do Brasil regulamentou os critérios para a criação de varas – fundamentais para agilizar a responsabilização de agressores, garantir a proteção da vítima e minimizar a revitimização de meninos e meninas. Além do contraste regional, a conseqüência é a elevada demanda dos juízes especializados: a média, no Brasil, é de 438,8 mil habitantes por magistrado (veja abaixo a média por Estado e por Região).“O levantamento mostra que ainda falta prioridade absoluta na organização do Sistema de Justiça da Infância e da Juventude no País”, resume o presidente da ABMP, Eduardo Rezende Melo. A Associação defende como critério a criação de vara especializada nos municípios com mais de 100 mil habitantes, pois as políticas de assistência social, saúde e educação partem do princípio de que as cidades de grande porte – justamente aquelas com mais de 100 mil habitantes – apresentam uma organização social complexa e sinais de vulnerabilidade que justificam a especialização dos serviços. A pesquisa identificou outro desrespeito ao ECA. Apesar do artigo 150 obrigar a criação de equipes multidisciplinares – com assistentes sociais, pedagogos, antropólogos, psicólogos, etc. – nas varas da infância, dois estados não cumprem a regra: Ceará e Rio Grande do Norte. Já no Distrito Federal e em seis estados (Acre, Alagoas, Bahia, Piauí, Tocantins e Pará) essas equipes estão presentes apenas nas capitais, ou, no máximo, em algumas grandes cidades.Formação precáriaSe o assunto é Direito da Criança e do Adolescente, a formação de magistrados, promotores e defensores públicos é precária, quando não inexistente. O levantamento mostra que não há espaço para o tema nas faculdades de Direito, nos editais de concurso público e nos cursos de formação inicial e continuada para aqueles que ingressaram na carreira.No caso da formação inicial dos aprovados em concurso, por exemplo, menos da metade das instituições do Sistema de Justiça realiza qualificação ou treinamento específico para os profissionais que irão atuar junto às varas da infância e juventude. Mesmo entre aqueles que promovem uma formação específica em direitos da criança e do adolescente, o curso dura, no máximo, oito horas.“Ainda existe um desafio enorme para o juiz, que não é formado em direito da infância, ter um olhar interdisciplinar”, afirma o presidente da ABMP, lembrando que a Justiça da infância lida com situações bastante complexas.O secretário-executivo do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), Benedito dos Santos, concorda. “O Conanda está solicitando o empenho da Justiça para a criação de varas da infância no maior número de municípios possível”, afirma. “Onde existem essas varas, os processos têm avançado muito. Mas esse avanço poderia ter sido muito maior”.CNJ deve publicar resoluçõesO resultado do levantamento foi apresentado ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no dia 9 de julho. A ABMP também apresentou propostas para fortalecer o Sistema (veja lista abaixo), com a expectativa de o CNJ determinar a implementação das medidas pelos Tribunais de Justiça do País.A iniciativa deve render resultados em breve. O juiz e conselheiro do CNJ Antonio Umberto de Souza Júnior disse que irá propor, na última reunião do Conselho de agosto, uma resolução determinando que o direito da infância e da adolescência seja incluído nos concursos de magistrados e seja tema de curso de formação dos juizes especializados. “Imagino que será aprovada sem dificuldade”, afirma Antonio Humberto.Sobre a falta de parâmetro para a criação de varas da infância de acordo com o número de habitantes, o conselheiro diz que o Departamento de Pesquisa Judiciária do CNJ fará um estudo para chegar a um critério ideal, que serviria de orientação. Segundo ele, o Conselho não tem poder de obrigar os Tribunais de Justiça a criar varas. “O ECA estabelece apenas a possibilidade de instalação das varas”, aponta. “Até setembro a gente deve concluir o estudo e verificar o que pode ser proposto”.Humberto também afirma que está sendo analisada uma nova resolução determinando que as varas da infância possuam equipes interdisciplinares. Ele lembra que a resolução nº 2 do CNJ já trata do assunto. “Não vamos repetir a recomendação, mas procurar uma forma de que a resolução se torne obrigatória, por exemplo, a elaboração de projetos de lei para criar equipes interdisciplinares a partir de determinados parâmetros. E, assim, termos um Sistema de Justiça mais atento”.* Acesse a íntegra do levantamento da ABMP, com mais dados por EstadoHabitantes por juiz especializado em infância e juventude – por Região
Região
Habitantes por juiz
Sudeste
503.188
Centro-oeste
494.551
Nordeste
433.975
Sul
302.009
Norte
279.357
Brasil
438.896Habitantes por juiz especializado em infância e juventude – por Estado
Estado
Habitantes por juiz
Amazonas
823.301
Pernambuco
748.648
Goiás
681.830
Rio de Janeiro
677.052
DF
613.975
Bahia
576.103
São Paulo
576.103
Ceará
486.283
Minas Gerais
443.106
Paraná
440.585
Santa Catarina
392.232
Piauí
389.969
Rondônia
369.345
Alagoas
366.454
Paraína
348.607
Mato Grosso do Sul
302.131
Acre
290.639
Maranhão
282.709
Mato Grosso
263.415
Sergipe
260.151
Rio Grande do Sul
252.754
Rio Grande do Norte
252.155
Roraima
249.853
Amapá
218.125
Pará
203.737
Tocantins
178.386
Espírito Santo
188.050
Sugestões da ABMPVeja as principais sugestões apresentadas pela ABMP ao CNJ:* Proporcionalidade para criação de varas- Todos os Tribunais de Justiça devem estabelecer critérios populacionais para a criação de varas com competência exclusiva em infância e juventude;- Devem ser observados os parâmetros do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e da Política Nacional de Assistência Social que consideram que as cidades com mais de 100 mil habitantes apresentam complexidade e indicadores de vulnerabilidade que demandam especialização dos serviços;* Equipes interdisciplinares- A equipe interprofissional deve ser formada por no mínimo três profissionais;- Nas comarcas onde exista vara especializada deverá haver equipe interprofissional exclusiva;- Os membros da equipe deverão integrar o quadro do poder judiciário mediante concurso público;* Formação de magistrados, promotores e defensores- Inclusão de capítulo próprio sobre direito da criança e do adolescente nos editais de concurso para as carreiras jurídicas;- Inclusão da disciplina obrigatória Direito da Criança e do Adolescente na graduação em Direito;- Criação de base mínima para cursos de formação e atualização continuada nas escolas estaduais de formação das carreiras.Sugestões de fontes:Eduardo Rezende Melo – juiz e presidente da Associação Brasileira de Magistrados, Promotores de Justiça e Defensores Públicos da Infância e da Juventude (ABMP)(11) 4238-8100 (ramal 258) e (11) 8268-9911Antonio Umberto de Souza Júnior – juiz e conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)Assessoria de imprensa: (61) 3217-4593Benedito Rodrigues dos Santos – secretário-executivo do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda)(61) 3429-3525 /3524Centros de Defesa da Criança e do AdolescenteAcesse aqui a lista de contatos dos Cedecas por EstadoSugestões de abordagem:- Acesse a íntegra da pesquisa e descubra qual a situação no seu Estado. O levantamento possui várias informações por Estado, como o número de varas especializadas, a média de população por vara ou por juiz, e a existência ou não de cursos de formação para os magistrados, promotores e defensores públicos.- Procure o Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do seu Estado (o link para a lista de contatos está acima). Os Cedecas acompanham os casos e buscam sua agilização, sendo boas fontes para explicar as vantagens de uma comarca contar com uma vara especializada.- Você pode mostrar, na prática, qual o impacto que uma vara da infância pode causar na vida de uma criança ou de um adolescente. Exemplo: compare o andamento de um processo que busca responsabilizar um agressor e que tramita em uma vara da infância, com um processo semelhante que tramita na Justiça comum. Relatar histórias de vida pode “humanizar” os números.

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